Ponto Cego ou as vozes inaudíveis é um livro que resulta de um ano de trabalho do Grupo do Trecho na Penitenciária Feminina de Santana (primeiro prédio construído do Complexo do Carandiru, não demolido após a desativação e reformado para tornar-se uma prisão feminina), em São Paulo/SP. As artistas trabalharam com um grupo de seis mulheres então detidas - Doralice de Oliveira Fonseca, Kelly dos Reis Santos, Lindasony Salgado Pereira, Tatiane Antunes, Valdelice Duarte Torres e Viviane Batista - para a produção de materialidades imagéticas e textuais que fossem capazes de atravessar as muralhas do Sistema e levar suas experiências ao mundo exterior.

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Como o trabalho previa uma publicação de conteúdos escritos por um grupo de detentas, o Comitê de Ética da Secretaria de Administração Penitenciária levou quase seis meses para dar às artistas Carolina Nóbrega e Nádia Recioli autorização para iniciar o trabalho na Penitenciária Feminina de Santana. A partir da conquista da autorização, tanto as integrantes do Grupo do Trecho, quanto o grupo de seis mulheres escolhidas para participar do projeto (que ganharam uma bolsa de trabalho, em valores maiores do que os pagos pelas oficinas/fábricas instaladas dentro da penitenciária), foram alertadas que qualquer material produzido, antes de poder ser retirado pelas artistas, ficaria retido para análise dos setores Educativo e de Segurança da Penitenciária; e que determinados conteúdos escritos poderiam implicar não apenas censura, como também castigo para as mulheres envolvidas. 

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Por conta disso, as artistas desenvolveram procedimentos de escrita e produção de imagens que protegessem as participantes do projeto, tais como exercícios de leitura, recorte e reescrita a partir de materiais de outros autores, através dos quais a rotina e o cerceamento institucional se revelassem por vias mais subjetivas, metafóricas e indiretas. Tal impedimento inicial acabou resultando em um processo de aprofundamento na singularidade de cada autora, explicitando a instituição a partir da complexidade dos indivíduos que ela aparta.

 

Todo o material foi concebido a próprio punho, com papel, caneta, tesoura e cola. O livro apresenta uma seleção e um sequenciamento desse material, em sua maioria transcrito para o formato digital, de forma a estimular ampla leitura de seus textos e efetivar o compartilhamento de suas experiências.